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É possível a readmissão de empregado?

Imagine a seguinte situação:

Uma empregada resolve pedir demissão, porque encontrou vaga de trabalho melhor. Formalizado o fim do contrato e pagas todas as verbas rescisórias, ela começa a trabalhar para outro empregador. Todavia, passado um mês na nova colocação, a empregada se arrepende da demissão e pede para retornar ao antigo trabalho.

Assim, indaga-se: o empregador pode recontratá-la? Em caso afirmativo, quais são os cuidados que devem ser tomados?

Inicialmente, cabe ressaltar que inexiste na legislação trabalhista qualquer dispositivo que vede a readmissão de empregado.

Nesse caso, a empresa deverá adotar todos os procedimentos normais como se o empregado fosse contratado pela primeira vez: abertura de nova Ficha de Registro (art. 41 da CLT); nova anotação da Carteira de Trabalho (CTPS – art. 29 da CLT); apresentação dos documentos admissionais; submissão a exame médico (itens 7.4.1 e 7.4.3.1 da NR-07 do antigo MTE), etc.

No exemplo acima, a empregada será readmitida para o exercício da mesma função. Logo, não poderá haver a redução de salário[1][1] Se a categoria possuir piso salarial previsto em norma coletiva, ele deverá ser observado, o que inclui eventuais reajustes de salário. Algumas Convenções Coletivas, igualmente, estabelecem regras específicas para a recontratação de empregado., sob pena de nulidade dessa cláusula contratual, conforme prevê o art. 9º da CLT. Além disso, não decorreu tempo suficiente para justificar a alteração salarial da função a ser ocupada (veja que se passou apenas 01 mês da rescisão do vínculo anterior).

Art. 9º da CLT: Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

Uma vez se tratando da mesma função[2][2] O mesmo raciocínio não se aplica se a função, a ser desempenhada pelo empregado readmitido, for diversa da anteriormente executada na empresa., o empregador também não poderá submeter a empregada a novo período de experiência (art. 443, §2º, “c” da CLT), pois pressupõe-se que as suas habilidades já tenham sido testadas no vínculo antecedente.

Atenção com a Portaria nº 384/92 do antigo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)

Segundo os arts. 1º e 2º da Portaria, considera-se fraudulenta[3][3] Trata-se de presunção que admite prova em contrário (presunção juris tantum). Havendo justificativa plausível para a readmissão de empregado dentro dos 90 dias, e sendo a empresa autuada por fraude ao FGTS, é possível recorrer da multa aplicada. a rescisão sem justa causa seguida de recontratação do mesmo empregado, ou sua permanência na empresa sem a formalização do vínculo, ocorrida dentro de 90 dias subsequentes ao fim do contrato de trabalho.

Art. 1° da Portaria nº 384/92 do MTE: A inspeção do trabalho dará tratamento prioritário, entre os atributos de rotina, a constatação de casos simulados de rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, seguida de recontratação do mesmo trabalhador ou de sua permanência na empresa sem a formalização do vínculo, presumindo, em tais casos, conduta fraudulenta do empregador para fins de aplicação dos §§ 2° e 3°, do art. 23, da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990.

Art. 2° da Portaria nº 384/92 do MTE: Considera-se fraudulenta a rescisão seguida de recontratação ou de permanência do trabalhador em serviço quando ocorrida dentro dos noventa dias subsequentes à data em que formalmente a rescisão se operou.

O objetivo do ato normativo é coibir a prática de dispensas fictícias visando o levantamento ilegal dos depósitos do FGTS, além de fraude ao programa do seguro-desemprego. Da mesma forma, existe a preocupação de evitar o fracionamento da relação de emprego em nítido prejuízo ao trabalhador.

Observe, porém, que a regra destina-se apenas às rescisões sem justa causa[4][4] Com a Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017), foi introduzida uma nova modalidade de extinção contratual: a rescisão de comum acordo (art. 484-A da CLT). Nela, o empregado, além das verbas rescisórias devidas, tem direito à multa de 20% sobre o saldo do FGTS e à movimentação da conta vinculada no limite de 80% do valor dos depósitos (art. 20, I-A da Lei nº 8.036/90). Logo, a regra dos 90 dias da Portaria nº 384/92 do MTE também se aplica, por analogia, à rescisão de comum acordo.. É que, em tal modalidade de extinção contratual, o empregado tem direito à multa de 40% sobre o saldo do FGTS e à movimentação da conta vinculada (arts. 18, §1º e 20, I da Lei nº 8.036/90), bem como ao gozo de seguro-desemprego por pelo menos 03 meses (arts. 2º, I e 4º da Lei nº 7.998/90).

Assim, a aplicação da Portaria nº 384/92 do MTE irá depender do tipo de rescisão contratual operada:

  • Dispensa sem justa causa ou rescisão de comum acordo (art. 484-A da CLT): o empregador deverá aguardar o prazo mínimo de 90 dias para recontratar o trabalhador;
  • Pedido de demissão: o empregador não precisará aguardar o prazo mínimo de 90 dias para a readmissão, pois o empregado não tem direito ao levantamento dos depósitos do FGTS e nem ao seguro-desemprego, o que afasta a finalidade da regra.

Então, no exemplo supracitado, a empresa poderá realizar a recontratação de imediato, haja vista a empregada ter pedido demissão para ocupar outra vaga de trabalho.

Detalhe: o descumprimento da Portaria poderá acarretar a aplicação de multa (art. 23, §§2º e 3º da Lei nº 8.036/90 e art. 25 da Lei nº 7.998/90), sem prejuízo de eventual responsabilização criminal do empregador pela utilização de meios fraudulentos para a habilitação ou percepção de seguro-desemprego.

Outros aspectos importantes

Considerando que a empregada pediu demissão e que o empregador não precisa aguardar 90 dias para recontratá-la, nos termos da Portaria nº 384/92 do MTE, é digno de nota o conteúdo do art. 133, I da CLT.

De acordo com o dispositivo, não terá direito a férias o empregado que, no curso do período aquisitivo, deixar o emprego e não for readmitido dentro de 60 dias subsequentes a sua saída:

Art. 133 da CLT: Não terá direito a férias o empregado que, no curso do período aquisitivo:
I- deixar o emprego e não for readmitido dentro de 60 (sessenta) dias subseqüentes à sua saída;
(…)
§2º: Iniciar-se-á o decurso de novo período aquisitivo quando o empregado, após o implemento de qualquer das condições previstas neste artigo, retornar ao serviço.
(…)

Nesse sentido, salvo se a empresa tiver muita urgência para recontratar a empregada, o melhor é aguardar o prazo de 60 dias. Isso, porque o período aquisitivo de férias será zerado, iniciando-se nova contagem. Do contrário, a trabalhadora, ainda que readmitida, terá direito ao aproveitamento do período aquisitivo anterior para o gozo de suas férias anuais.

Em relação à dispensa sem justa causa ou à rescisão de comum acordo, não há que se falar na aplicação do art. 133 da CLT, pois, em ambos os casos, o empregador obrigatoriamente deverá aguardar o prazo de 90 dias para readmitir o empregado, sob pena de configuração de fraude ao FGTS (Portaria nº 384/92 do MTE).

Por fim, cumpre sublinhar a previsão do art. 453 da CLT e da Súmula nº 138 do TST.

Exceto nas hipóteses de dispensa com justa causa, aposentadoria espontânea ou recebimento de indenização legal[5][5] É o caso da rescisão sem justa causa e da rescisão de comum acordo (art. 484-A da CLT)., contam-se a favor do empregado, quando da sua readmissão, todos os períodos trabalhados na empresa, ainda que eles sejam descontínuos:

Art. 453 da CLT: No tempo de serviço do empregado, quando readmitido, serão computados os períodos, ainda que não contínuos, em que tiver trabalhado anteriormente na empresa, salvo se houver sido despedido por falta grave, recebido indenização legal ou se aposentado espontaneamente.
(…)

SÚMULA Nº 138 DO TST: READMISSÃO (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Em caso de readmissão, conta-se a favor do empregado o período de serviço anterior, encerrado com a saída espontânea (ex-Prejulgado nº 9).

Portanto, a empregada do exemplo, se recontratada, terá direito à contagem do período anterior de serviço na empresa.

Obras consultadas

  • SAMPAIO, José Damasceno. Rotinas Trabalhistas: extinção do contrato individual de emprego. 2. ed. São Paulo: LTr, 2013, p. 13-14.
  • VIANNA, Cláudia Salles Vilela. Manual Prático das Relações Trabalhistas. 12. ed. São Paulo: LTr, 2014, p. 94.