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Medida Provisória altera regras para o recolhimento de contribuições aos sindicatos

No dia 01/03/2019, foi publicada a Medida Provisória nº 873 que aprofunda a mudança, iniciada pela Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017), quanto ao custeio das entidades sindicais. O texto é de cumprimento obrigatório e já se encontra em vigor[1][1] Segundo o art. 62 da CR/88, a Medida Provisória apresenta força de lei e deve ser submetida ao Congresso Nacional para exame, emissão de parecer e votação no plenário da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Se a MP, no prazo de 120 dias contados da data de sua publicação, não for convertida em lei, ela perde a sua eficácia..

Em resumo, a MP nº 873/2019 alterou a redação dos arts. 545, 578, 579 e 582 da CLT e incluiu o art. 579-A no diploma celetista, além de ter revogado o art. 240, “c” da Lei nº 8.112/90[2][2] A Lei nº 8.112/90 dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das Autarquias e Fundações Públicas Federais., que estabelecia o desconto em folha, sem ônus para o sindicato a que for filiado o servidor público, dos valores correspondentes às mensalidades e contribuições aprovadas pela Assembleia Geral da categoria[3][3] Desde a publicação da Medida Provisória, foram propostas duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI nº 6.092-DF e ADI nº 6.093-DF de relatoria do Min. Luiz Fux) perante o STF, em face de seu art. 2º, “b” que revogou a alínea “c” do art. 240 da Lei nº 8.112/90. Tais ações, movidas pela Confederação Nacional das Carreiras Típicas de Estado – CONACATE, pela Federação de Sindicatos de Professores de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico – PROIFES e pelo Sindicato dos Professores do Ensino Superior Público Federal – SIND-PROIFES, alegam violação à liberdade sindical e de associação dos servidores públicos federais (art. 37, VI, art. 5º, XVII e art. 8º, V da CR/88), além de interferência do Estado na organização e funcionamento dos sindicatos (art. 5º, XVIII e art. 8º, I da CR/88), haja vista a exigência do recolhimento das mensalidades e contribuições por boleto bancário ou outro meio eletrônico equivalente (art. 8º, IV da CR/88). Por fim, uma das ações defende ainda a inexistência dos requisitos de relevância e urgência para tratar o tema através de MP, constituindo mero artifício do governo para enfraquecer as entidades e sufocar a sua capacidade financeira..

Agora, para os empregados, não é mais autorizado o desconto da contribuição sindical (antigo imposto sindical) na folha de pagamento pelo empregador. O recolhimento, nos termos do art. 582 da CLT, deverá ser efetuado através de boleto bancário a ser encaminhado para a residência do trabalhador ou, na sua impossibilidade, à sede da empresa.

Tal exigência é estendida também para o pagamento das demais contribuições e mensalidades aprovadas em Assembleia Geral, previstas no estatuto das entidades sindicais ou instituídas por negociação coletiva (art. 545 da CLT).

Logo, a medida transfere a responsabilidade do recolhimento desses valores do empregador para o empregado, desde que ele seja filiado ao sindicato ou autorize de forma voluntária, individual e expressa a sua cobrança.

Quanto à facultatividade da contribuição sindical (antigo imposto sindical)[4][4] O fim da obrigatoriedade da contribuição sindical (antigo imposto sindical) foi uma das alterações promovidas pela Reforma Trabalhista. Por sua vez, na ADI nº 5.794-DF, de relatoria do Min. Edson Fachin, restou confirmada a validade (constitucionalidade) dessa mudança. O acórdão da decisão, cuja redação ficou a cargo do Min. Luiz Fux (voto divergente e vencedor), ainda não foi disponibilizado no site do STF. e demais valores devidos à entidade representativa (taxas, mensalidades, contribuições assistencial e confederativa, etc), a MP nº 873/2019 incorporou na CLT (art. 579-A) os entendimentos consolidados do TST[5][5] Precedente Normativo nº 119 do TST e Orientação Jurisprudencial nº 17 da SDC do TST. e do STF[6][6] Súmula Vinculante nº 40 do STF e Súmula nº 666 do STF. sobre o tema.

Paralelamente, a Medida Provisória tornou sem efeito alguns artifícios utilizados pelos sindicatos para driblar a perda das fontes de receita devido à Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017) e aos entendimentos jurisprudenciais consolidados.

Assim, não basta a autorização prévia e expressa do empregado (não filiado) para a cobrança das diversas contribuições. É ainda necessária que a autorização seja individual e por escrito, o que inviabiliza a cobrança de valores por autorização tácita[7][7] Autorização tácita nada mais é que autorização implícita do empregado. do trabalhador ou sem o seu requerimento de oposição (art. 579, §1º da CLT), tal como preveem algumas normas coletivas:

Segundo a nova redação do art. 579, §2º da CLT, será nula qualquer regra ou cláusula de Acordo e Convenção Coletiva que fixe a obrigatoriedade do recolhimento de contribuições, mesmo que referendada “por negociação coletiva, assembleia geral ou outro meio previsto no estatuto da entidade”[8][8] O citado dispositivo legal diverge da posição defendida por Maurício Godinho Delgado (2018, p. 1.600) e pelo Ministério Público do Trabalho – CONALIS, no tocante à possibilidade de cobrança das contribuições, aprovadas pela Assembleia Geral da categoria, de todos os seus integrantes para o custeio das atividades do sindicato (art. 513, “e” da CLT). Trata-se da contribuição assistencial, também chamada de contribuição de fortalecimento sindical, cota de solidariedade, etc. Para essa posição, é justo e equânime o pagamento desse valor, pois as vantagens alcançadas na negociação coletiva favorecem toda a categoria, independente de o empregado ser filiado ou não à entidade. Todavia, não é o posicionamento majoritário da jurisprudência.:

Por fim, cumpre sublinhar que as novas regras instituídas pela Medida Provisória são aplicáveis, igualmente, às empresas vinculadas as suas respectivas categorias econômicas.

Abaixo, segue quadro comparativo para facilitar a compreensão das alterações mencionadas:

ANTES DA MP Nº 873/2019 DEPOIS DA MP Nº 873/2019
Art. 545 da CLT: Os empregadores ficam obrigados a descontar da folha de pagamento dos seus empregados, desde que por eles devidamente autorizados, as contribuições devidas ao sindicato, quando por este notificados.
Parágrafo único: O recolhimento à entidade sindical beneficiária do importe descontado deverá ser feito até o décimo dia subseqüente ao do desconto, sob pena de juros de mora no valor de 10% (dez por cento) sobre o montante retido, sem prejuízo da multa prevista no art. 553 e das cominações penais relativas à apropriação indébita.
Art. 545 da CLT: As contribuições facultativas ou as mensalidades devidas ao sindicato, previstas no estatuto da entidade ou em norma coletiva, independentemente de sua nomenclatura, serão recolhidas, cobradas e pagas na forma do disposto nos art. 578 e art. 579.
Parágrafo único: Revogado
Art. 578 da CLT: As contribuições devidas aos sindicatos pelos participantes das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação de contribuição sindical, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo, desde que prévia e expressamente autorizadas. Art. 578 da CLT: As contribuições devidas aos sindicatos pelos participantes das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão recolhidas, pagas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo, sob a denominação de contribuição sindical, desde que prévia, voluntária, individual e expressamente autorizado pelo empregado.
Art. 579 da CLT: O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 desta Consolidação. Art. 579 da CLT: O requerimento de pagamento da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e voluntária do empregado que participar de determinada categoria econômica ou profissional ou de profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, na inexistência do sindicato, em conformidade o disposto no art. 591.
§1º: A autorização prévia do empregado a que se refere o caput deve ser individual, expressa e por escrito, não admitidas a autorização tácita ou a substituição dos requisitos estabelecidos neste artigo para a cobrança por requerimento de oposição.
§2º: É nula a regra ou a cláusula normativa que fixar a compulsoriedade ou a obrigatoriedade de recolhimento a empregados ou empregadores, sem observância do disposto neste artigo, ainda que referendada por negociação coletiva, Assembleia-Geral ou outro meio previsto no estatuto da entidade.
Sem previsão legal Art. 579-A da CLT: Podem ser exigidas somente dos filiados ao sindicato:
I- a contribuição confederativa de que trata o inciso IV do caput do art. 8º da Constituição;
II- a mensalidade sindical; e
III- as demais contribuições sindicais, incluídas aquelas instituídas pelo estatuto do sindicato ou por negociação coletiva.
Art. 582 da CLT: Os empregadores são obrigados a descontar da folha de pagamento de seus empregados relativa ao mês de março de cada ano a contribuição sindical dos empregados que autorizaram prévia e expressamente o seu recolhimento aos respectivos sindicatos.
§1º: Considera-se um dia de trabalho, para efeito de determinação da importância a que alude o item I do art. 580, o equivalente:
a) a uma jornada normal de trabalho, se o pagamento ao empregado for feito por unidade de tempo;
b) a 1/30 (um trinta avos) da quantia percebida no mês anterior, se a remuneração for paga por tarefa, empreitada ou comissão.
§2º: Quando o salário for pago em utilidades, ou nos casos em que o empregado receba, habitualmente, gorjetas, a contribuição sindical corresponderá a 1/30 (um trinta avos) da importância que tiver servido de base, no mês de janeiro, para a contribuição do empregado à Previdência Social.
Art. 582 da CLT: A contribuição dos empregados que autorizarem, prévia e expressamente, o recolhimento da contribuição sindical será feita exclusivamente por meio de boleto bancário ou equivalente eletrônico, que será encaminhado obrigatoriamente à residência do empregado ou, na hipótese de impossibilidade de recebimento, à sede da empresa.
§1º: A inobservância ao disposto neste artigo ensejará a aplicação do disposto no art. 598.
§2º: É vedado o envio de boleto ou equivalente à residência do empregado ou à sede da empresa, na hipótese de inexistência de autorização prévia e expressa do empregado.
§3º: Para fins do disposto no inciso I do caput do art. 580, considera-se um dia de trabalho o equivalente a:
I- uma jornada normal de trabalho, na hipótese de o pagamento ao empregado ser feito por unidade de tempo; ou
II- 1/30 (um trinta avos) da quantia percebida no mês anterior, na hipótese de a remuneração ser paga por tarefa, empreitada ou comissão.
§4º: Na hipótese de pagamento do salário em utilidades, ou nos casos em que o empregado receba, habitualmente, gorjetas, a contribuição sindical corresponderá a 1/30 (um trinta avos) da importância que tiver servido de base, no mês de janeiro, para a contribuição do empregado à Previdência Social.

ATUALIZAÇÃO (03/05/2019): Desde a publicação deste post, já foram apresentadas no STF mais 06 Ações Diretas de Inconstitucionalidade[9][9] São elas: ADI`s nº 6.098-DF, 6.099-DF, 6.101-DF, 6.108-DF, 6.114-DF e 6.115-DF. contra dispositivos da MP nº 873/2019. Essas ações foram distribuídas, por prevenção, ao Min. Luiz Fux para apreciação conjunta com a ADI nº 6.092-DF.

Na ADI nº 6.098-DF, movida pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, a Advocacia-Geral da União manifestou-se pela improcedência da ação.

Em resumo, afirmou o órgão que a Medida Provisória atende aos requisitos de relevância e urgência previstos na Constituição, não cabendo ao Poder Judiciário realizar o exame de mérito do ato, salvo na hipótese de evidente abuso, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes.

Que a MP nº 873/2019 visou assegurar a eficácia do fim da cobrança obrigatória do antigo imposto sindical – mudança implementada pela Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017), em nada se relacionando à temática de cidadania que não pode ser abordada via Medida Provisória (art. 62, §1º, I, “a” da CR/88).

Alegou ainda a Advocacia-Geral da União que o método de recolhimento das mensalidades e contribuições sindicais é tema infraconstitucional e, portanto, não sujeito à proteção dos princípios da liberdade e autonomia sindicais. E que a alteração promovida pela Medida Provisória, ao contrário, objetivou “conferir maior independência às entidades sindicais e associativas, uma vez que lhes permite operacionalizar o custeio de suas atividades por meio de instrumentos próprios”, sem a interferência do Poder Público ou de organizações privadas.

Por fim, o órgão defendeu que a exigência de autorização prévia, expressa, individual e voluntária para a cobrança das contribuições não ofenderia a liberdade sindical, pois tal princípio possui limites legais, a exemplo do art. 611-A da CLT, o que restringiria o alcance do art. 7º, XXVI da CR/88. Além disso, a exigência introduzida pela MP nº 873/2019 reforçaria a própria liberdade de associação, ao impedir que a autorização individual seja suprida pela deliberação geral da categoria.

ATUALIZAÇÃO (18/05/2019): No dia 15/05/2019, a Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical – CONALIS, vinculada ao Ministério Público do Trabalho (MPT), divulgou a Nota Técnica nº 03/2019 em que se posiciona contrária às mudanças promovidas pela MP nº 873/2019.

Para o órgão, as alterações violam a autonomia privada coletiva, a liberdade sindical e a livre negociação (art. 8º, caput, I e VI da CR/88 e Convenções nº 87, 98 e 154 da OIT), ao impedirem que os sindicatos estabeleçam livremente formas de financiamento e de desconto das contribuições, o que configuraria “grave e vedada interferência e intervenção do Estado na organização sindical”.

Além disso, a exigência do boleto bancário “tem o potencial de inviabilizar a atuação sindical, e fragilizar o sistema de financiamento dos sindicatos, cuja missão é coletiva e não individual”. Paralelamente, a Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), ao consagrar a prevalência do negociado sobre o legislado, teria maximizado o valor das normas coletivas de trabalho, admitindo o desconto salarial previsto em convenção ou acordo coletivo desde que autorizado (art. 8º, I da CR/88 c/c arts. 611 e 611-B, XXVI da CLT).

Que os trabalhadores, abrangidos pela negociação, devem contribuir com o financiamento desse processo, “sob pena de inviabilizar e fragilizar a atuação sindical, bem como desincentivar novas filiações”. Nessa hipótese, não restaria descumprida a liberdade sindical negativa (a de não se filiar), pois a cobrança dependeria do não exercício do direito de oposição.

Acrescentou o MPT que a Assembleia Geral é fonte legítima não só para estipular novas condições de trabalho (art. 611 da CLT), como também “fixar a contribuição destinada ao custeio das atividades sindicais, podendo dispor sobre o valor, a forma do desconto, a finalidade e a destinação da contribuição” (art. 513, “e” da CLT).

O órgão concluiu ainda que os acordos e convenções coletivas de trabalho pactuados antes da publicação da MP nº 873/2019 não poderiam ser atingidos pelas suas disposições, em razão do direito adquirido e do ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI da CR/88). E que as cláusulas negociadas, na vigência da Medida Provisória, estariam protegidas pela força da autonomia privada coletiva e pelo disposto no art. 611-A da CLT.

Obras consultadas