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Estudo de Caso: Aviso Prévio durante garantia de emprego

Um cliente entrou em contato com a seguinte dúvida:

Gostaria de desligar uma empregada que retornou do afastamento previdenciário (auxílio-doença) no dia 12/09/2018. Todavia, a Convenção Coletiva da categoria estabelece:

OUTRAS ESTABILIDADES
CLÁUSULA DÉCIMA SÉTIMA – ESTABILIDADE AUXÍLIO-DOENÇA

Assegura-se a estabilidade provisória de 60 (sessenta) dias para o empregado que tenha retornado à empresa após doença, desde que tenha havido o correspondente afastamento pela Previdência Social por prazo superior a 30 (trinta) dias.

Considerando que a trabalhadora se enquadra na hipótese da cláusula 17ª da CCT, queria saber se a rescisão do contrato de trabalho poderia ser efetuada no dia 12/11/2018. Nesse caso, o aviso prévio teria início em 04/10/2018, com término na data de 12/11/2018.

Ou seja, o aviso prévio laborado começaria no período de estabilidade e findaria após o prazo da garantia de emprego estabelecido na norma coletiva. É possível?

Para facilitar a compreensão:

12/09 a 10/11/2018: 60 dias de estabilidade provisória
04/10 a 12/11/2018: 40 dias de aviso prévio

Noções iniciais sobre o tema

O aviso prévio está previsto no art. 7º, XXI da CR/88 e nos arts. 487 a 491 da CLT. Trata-se de uma obrigação atribuída à parte que deseja terminar o contrato de trabalho.

Art. 7º da CR/88: São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(…)
XXI- aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;
(…)

Segundo Maurício Godinho Delgado (2018, p. 1.400), ele possui uma natureza multidimensional, pois visa: i) declarar ao destinatário a vontade unilateral de romper o vínculo empregatício; ii) fixar o prazo para a efetiva extinção contratual e iii) assegurar o pagamento do respectivo período.

A finalidade de notificar a parte adversa delimita as hipóteses de cabimento do aviso prévio. Como regra, tal instituto é característico dos contratos de trabalho por prazo indeterminado (art. 487 da CLT). Ou seja, quando não há data fixada para o encerramento do vínculo entre os envolvidos.

Nesse sentido, o aviso prévio minimiza o impacto do término do contrato de trabalho, conferindo tempo ao empregado para buscar uma nova ocupação ou ao empregador para encontrar um substituto apto a preencher o cargo futuramente vago.

Todavia, para além dessas hipóteses de resilição[1][1] De acordo com Alice Monteiro de Barros (2009, p. 954): a resilição contratual ocorre quando nenhuma das partes praticou falta. São os casos de dispensa sem justa causa pelo empregador e de pedido de demissão pelo empregado. Já a resolução contratual acontece quando o vínculo de emprego termina por culpa de uma ou ambas as partes. Tratam-se das hipóteses tradicionais de justa causa (arts. 482 e 483 da CLT) e de culpa recíproca dos envolvidos nos termos do art. 484 da CLT. contratual, o legislador assegura o direito ao aviso prévio também na situação de rescisão indireta (justa causa do empregador – arts. 483 e 487, §4º da CLT) e quando o contrato, por prazo determinado, apresenta cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão antes do termo ajustado:

Art. 481 da CLT: Aos contratos por prazo determinado, que contiverem cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão antes de expirado o termo ajustado, aplicam-se, caso seja exercido tal direito por qualquer das partes, os princípios que regem a rescisão dos contratos por prazo indeterminado.

Em resumo, portanto, cabe aviso prévio na(o):

  • dispensa sem justa causa por iniciativa do empregador (art. 487 da CLT);
  • pedido de demissão por iniciativa do empregado (art. 487 da CLT);
  • rescisão indireta do contrato de trabalho (art. 487, §4º da CLT);
  • contrato com cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão (art. 481 da CLT)

Cumpre sublinhar ainda que o aviso prévio será devido pela metade se o contrato de trabalho for rompido por culpa de ambas as partes (art. 484 da CLT e Súmula nº 14 do TST). Igual resultado se tem na nova modalidade de extinção do vínculo empregatício (por acordo das partes), introduzida pela Reforma Trabalhista – Lei nº 13.467/2017:

Art. 484-A da CLT: O contrato de trabalho poderá ser extinto por acordo entre empregado e empregador, caso em que serão devidas as seguintes verbas trabalhistas:
I- por metade:
a) o aviso prévio, se indenizado; e
b) a indenização sobre o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, prevista no §1º do art. 18 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990;
II- na integralidade, as demais verbas trabalhistas.

Embora a CLT não estabeleça forma específica para o aviso prévio, recomenda-se a notificação por escrito, com campo específico para a assinatura do empregado e de 02 testemunhas (cf. art. 20 da IN nº 15/2010 da SRT do MTE). Uma vez pré-avisado o empregado ou empregador, seu prazo tem início no dia seguinte, conforme dispõe a Súmula nº 380 do TST:

SÚMULA Nº 380 DO TST: AVISO PRÉVIO. INÍCIO DA CONTAGEM. ART. 132 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 122 da SBDI-1) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005. Aplica-se a regra prevista no “caput” do art. 132 do Código Civil de 2002 à contagem do prazo do aviso prévio, excluindo-se o dia do começo e incluindo o do vencimento (ex-OJ nº 122 da SBDI-1 – inserida em 20.04.1998).

Como se sabe, o aviso prévio tem o prazo mínimo de 30 dias. Entretanto, no dia 13/10/2011, entrou em vigor a Lei nº 12.506 que regulamentou o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço.

Logo, para as rescisões contratuais ocorridas após 13/10/2011 (cf. Súmula nº 441 do TST), deverão ser acrescidos ao aviso prévio 03 dias por ano de serviço prestado na mesma empresa, até o máximo de 60 dias, perfazendo um total de 90 dias.

Dada a superficialidade da lei publicada, o MTE editou a Norma Técnica nº 184/2012[2][2] A título de esclarecimento, a Norma Técnica nº 184/2012 substituiu a Circular nº 010/2011 da Secretaria de Relações do Trabalho, órgão vinculado ao MTE. para esclarecer alguns pontos relevantes, com destaque:

  1. A proporcionalidade prevista na Lei nº 12.506/2011 é aplicada exclusivamente em favor do trabalhador. Em caso de pedido de demissão, o empregador poderá exigir apenas 30 dias de aviso prévio do empregado;
  2. O aviso prévio varia de 30 a 90 dias;
  3. A duração do aviso prévio integra o tempo de serviço do empregado para todos os fins, ainda que indenizado;
  4. Na hipótese de aviso prévio trabalhado, fica mantida a regra do art. 488 da CLT durante os 30 dias (redução da jornada em 02 horas diárias ou ausência ao serviço por 07 dias corridos). Para prazos superiores, o restante do período deverá ser indenizado pelo empregador;
  5. Ainda que indenizado, o prazo do aviso prévio deve ser considerando para fins de aplicação do art. 9º das Leis nº 6.708/79 e 7.238/84[3][3] As leis citadas tratam da indenização adicional, devida ao trabalhador, no caso de dispensa no trintídio anterior à data base da respectiva categoria profissional.. No mesmo sentido, conferir as Súmulas nº 182 e 242 do TST.

No tocante ao cumprimento do aviso prévio, admite-se a sua forma indenizada ou trabalhada. Em qualquer das duas modalidades, porém, a entrega dos documentos e o pagamento rescisório devem ser efetuados em até 10 dias contados do término do contrato, sob pena de multa (art. 477, §§6º e 8º da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467/2017).

Havendo trabalho, na dispensa promovida pela empresa, é garantida a opção ao empregado de laborar os 30 dias com redução da sua jornada em 02 horas diárias ou ausência ao serviço por 07 dias corridos, sem prejuízo do salário integral. Veja que tal opção é concedida somente nas extinções por iniciativa do empregador.

Como bem explica Alice Monteiro de Barros (2009, p. 957-958), em se tratando de pedido de demissão, a redução do art. 488 da CLT não é aplicada, pois presume-se que o empregado já tenha encontrado um novo emprego ou uma outra ocupação.

Quando o aviso prévio for trabalhado, a data de saída na CTPS coincidirá com o último dia laborado pelo empregado. Por outro lado, se o aviso prévio for indenizado, a data de saída na CTPS será a do último dia da sua projeção, segundo estabelecem a OJ nº 82 da SDI-I do TST e art. 17 da IN nº 15/2010 da SRT do MTE:

OJ Nº 82 DA SDI-I DO TST: AVISO PRÉVIO. BAIXA NA CTPS (inserida em 28.04.1997). A data de saída a ser anotada na CTPS deve corresponder à do término do prazo do aviso prévio, ainda que indenizado.

Art. 17 da IN nº 15/2010 da SRT do MTE: Quando o aviso prévio for indenizado, a data da saída a ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS deve ser:
I- na página relativa ao Contrato de Trabalho, a do último dia da data projetada para o aviso prévio indenizado; e
II- na página relativa às Anotações Gerais, a data do último dia efetivamente trabalhado.
Parágrafo único: No TRCT, a data de afastamento a ser consignada será a do último dia efetivamente trabalhado.

A questão da garantia de emprego nos contratos de trabalho

Na prática, embora as expressões “estabilidade no emprego” e “garantia de emprego” sejam usadas de maneira indistinta, tecnicamente, elas apresentam significados diferentes.

Esclarece Maurício Godinho Delgado (2018, p. 1.481) que a estabilidade “é a vantagem jurídica de caráter permanente deferida ao empregado em virtude de uma circunstância tipificada de caráter geral, de modo a assegurar a manutenção indefinida no tempo do vínculo empregatício, independentemente da vontade do empregador”.

Já a garantia, continua o autor (p. 1.488), “é a vantagem jurídica de caráter transitório deferida ao empregado em virtude de uma circunstância contratual ou pessoal obreira de caráter especial, de modo a assegurar a manutenção do vínculo empregatício por um lapso temporal definido, independentemente da vontade do empregador”.

Logo, o caso aqui analisado, qual seja a estabilidade da empregada em decorrência do auxílio-doença (cláusula 17ª da CCT), é típica hipótese de garantia de emprego e não de estabilidade. Isso, porque ela possui caráter transitório (60 dias) e decorre de uma circunstância pessoal do trabalhador (gozo de benefício previdenciário superior a 30 dias).

A principal consequência da garantia de emprego (ou estabilidade provisória) é a impossibilidade de extinção do contrato de trabalho por parte do empregador. Assim, durante certo lapso temporal, há uma restrição do poder empregatício na direção do negócio.

Havendo a dispensa irregular do empregado, a ordem jurídica considera nulo o ato (art. 9º da CLT), assegurando a sua reintegração ao trabalho. Não sendo recomendável o retorno do obreiro ao cargo anteriormente ocupado, a jurisprudência admite a substituição da reintegração pelo pagamento de indenização correspondente ao período estabilitário.

Há que se destacar, porém, que a regra é a reintegração. Somente nas situações de extinção da empresa ou fechamento do estabelecimento empresarial (arts. 497 e 498 da CLT); animosidade entre as partes (art. 496 da CLT); e exaurimento do período de estabilidade (Súmula nº 396, I do TST) que se concede o pagamento da indenização substitutiva.

Nesse sentido, não pode o empregador dispensar arbitrariamente o empregado, ainda que pretenda indenizar o tempo de estabilidade provisória. Primeiro, pois o aviso prévio é incompatível com a garantia de emprego, nos termos da Súmula nº 348 do TST:

SÚMULA Nº 348 DO TST: AVISO PRÉVIO. CONCESSÃO NA FLUÊNCIA DA GARANTIA DE EMPREGO. INVALIDADE (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. É inválida a concessão do aviso prévio na fluência da garantia de emprego, ante a incompatibilidade dos dois institutos.

Enquanto o aviso prévio visa conceder prazo para o trabalhador buscar uma nova ocupação, a garantia de emprego tem a finalidade de dar tranquilidade ao empregado, impedindo a resilição contratual ao longo de certo período. Daí a natureza antagônica dos institutos citados.

Segundo, porque a ocorrência do aviso prévio, durante a estabilidade provisória, implica a indevida subtração do tempo de serviço do empregado. É o que ressalta Cláudia Salles Vianna (2014, p. 533) e o que se verifica no presente caso.

Observe que a empresa, ao conceder aviso prévio no dia 04/10/2018, subtrai 01 mês e 06 dias do tempo de serviço da empregada (até 10/11/2018), o que prejudica, por exemplo, a sua contagem para fins de aposentadoria e a percepção de eventuais vantagens econômicas concedidas à categoria.

12/09 a 10/11/2018: 60 dias de estabilidade
04/10 a 12/11/2018: 40 dias de aviso prévio

A solução do caso concreto

Do exposto, a empresa não pode conceder aviso prévio de 40 dias durante a estabilidade provisória da empregada. O correto é aguardar os 60 dias previstos na cláusula 17ª da CCT e, depois, notificá-la da intenção de romper o contrato de trabalho.

Nessa hipótese, o aviso prévio pode ser dado a partir do dia 11/11/2018, iniciando a contagem do prazo no dia seguinte. Apenas um lembrete: no aviso prévio trabalhado, o empregador poderá exigir apenas 30 dias de labor, indenizando os 10 dias restantes em favor da empregada.

Em caso de descumprimento, a empresa corre o risco de sofrer multa normativa (por violação de cláusula da Convenção Coletiva), além de reclamatória com pedido de nulidade da dispensa e consequente reintegração ao trabalho.

Obras consultadas

  • BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 5. ed. 2ª tiragem. revista e ampliada. São Paulo: LTr, 2009, p. 954-963 e 972, 978-980.
  • DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 17. ed. obra revista, atualizada e ampliada, conforme a Lei nº 13.467/17 e MPr. nº 808/17. São Paulo: LTr, 2018, p. 1.399-1.409, 1.470 e 1.481-1.500.
  • NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 1.143-1.157.
  • PINTO, Raymundo Antônio Carneiro. Súmulas do TST Comentadas. 13. ed. São Paulo: LTr, 2012.
  • VIANNA, Cláudia Salles Vilela. Manual Prático das Relações Trabalhistas. 12. ed. São Paulo: LTr, 2014, p. 527-535 e 742-762.