Para quem gosta ou se interessa pelo tema, assistir “Estou me guardando para quando o carnaval chegar” e “Indústria Americana” vai revelar, de diferentes formas, a mudança nas atuais relações de trabalho e como a globalização e o avanço tecnológico contribuem para esse processo.
Enquanto o documentário brasileiro[1][1] O documentário é dirigido por Marcelo Gomes, também responsável pelo filme “Cinema, aspirinas e urubus” (2005). Depois de ser exibido na mostra competitiva do 24º Festival de Documentários, É tudo verdade, o título recebeu menção honrosa do júri oficial e da Associação de Brasileira de Documentaristas e Curta-Metragistas, bem como foi escolhido como melhor filme pelo júri da Associação Brasileira de Críticos de Cinema. se passa na cidade de Toritama, agreste pernambucano, que é polo na produção de jeans, o outro[2][2] Com a direção de Steven Bognar e Julia Reichert, o documentário foi produzido pelo casal Obama para ser a primeira atração da sua produtora Higher Ground. mostra o fechamento da fábrica da General Motors, em Dayton – estado de Ohio, e o impacto que a paralisação do serviço causou na comunidade local. E, após a compra da planta fabril por um empresário chinês, o choque cultural dos empregados americanos com a administração chinesa.
Apesar da distância geográfica entre Toritama e Dayton, além das inegáveis particularidades de cada cidade, ambos documentários exibem a exploração do labor humano através do relatos de seus personagens e respectivas rotinas diárias. A precariedade das condições de labor e os baixos salários são a tônica que permeia as duas produções.
Só que, no Brasil, há um detalhe interessante. Os moradores de Toritama, que participam da cadeia de produção do jeans, não têm a plena consciência da exploração que sofrem, pois são “donos do próprio negócio”[3][3] Pequenas oficinas de costura, a maioria improvisada no fundo de quintal., ainda que isso signifique trabalhar mais de 16 horas por dia, 06 dias por semana e sem proteção contra acidentes de trabalho.
O único momento de lazer desses pequenos “empresários” é justamente o carnaval, época em que abandonam a cidade e partem em direção às praias do litoral do estado. E, para custearem a viagem, eles vendem tudo, ou seja, todos os bens que adquiriram em um ano de trabalho. Na volta, o ciclo se inicia novamente.
Tais realidades demonstram de maneira clara a falácia da defesa do crescimento econômico às custas da proteção do trabalhador e evidenciam que se tornar autônomo ou microempreendedor, ao contrário do alardeado pelo governo e imprensa, talvez não seja tão vantajoso assim.
Óbvio que mudanças sociais são inevitáveis, mas elas devem ser acompanhadas de reflexão. É o que os dois documentários aqui tratados proporcionam ao telespectador.