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TST fixa tese jurídica sobre intervalo intrajornada

Até a entrada em vigor da Lei nº 13.467 – Reforma Trabalhista, no dia 11/11/2017, a supressão total ou parcial do intervalo intrajornada gerava o pagamento de todo o período[1][1] O intervalo do art. 71 da CLT corresponde ao período de 01 hora (até o máximo de 02 horas) ou 15 minutos, não computado na jornada de trabalho, em que o empregado susta a prestação de serviços e a sua disponibilidade em face do empregador. É a pausa voltada para a alimentação e recuperação das energias do obreiro. como hora extra (valor da hora normal acrescida de, no mínimo, 50%), em favor do empregado, ainda que a jornada não tivesse superado as 08 horas diárias.

Trata-se de interpretação trazida pela Lei nº 8.923/94 que introduziu o §4º no art. 71 da CLT e, depois, foi incorporada na Súmula nº 437, I do TST:

Art. 71 da CLT: Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas.
§1º: Não excedendo de 6 (seis) horas o trabalho, será, entretanto, obrigatório um intervalo de 15 (quinze) minutos quando a duração ultrapassar 4 (quatro) horas.
§2º: Os intervalos de descanso não serão computados na duração do trabalho.
(…)
§4º: Quando o intervalo para repouso e alimentação, previsto neste artigo, não for concedido pelo empregador, este ficará obrigado a remunerar o período correspondente com um acréscimo de no mínimo cinqüenta por cento sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.
(…)

SÚMULA Nº 437 DO TST: INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA CLT (conversão das Orientações Jurisprudenciais nº 307, 342, 354, 380 e 381 da SBDI-1) – Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012.
I- Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não-concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração.
(…)
III- Possui natureza salarial a parcela prevista no art. 71, §4º, da CLT, com redação introduzida pela Lei nº 8.923, de 27 de julho de 1994, quando não concedido ou reduzido pelo empregador o intervalo mínimo intrajornada para repouso e alimentação, repercutindo, assim, no cálculo de outras parcelas salariais.
(…)

A Lei nº 8.923/94, ao atribuir efeitos remuneratórios[2][2] Isso significa que o pagamento do intervalo intrajornada descumprido apresentava natureza salarial, repercutindo no cálculo das demais verbas, conforme dispôs a Súmula nº 437, III do TST. na hipótese de descumprimento do intervalo, criou, segundo Maurício Godinho Delgado (2018, p. 1.129), a figura do tempo ficto extraordinário ou horas extras fictas. Ou seja, a ausência do descanso implicava o pagamento do período completo como se fosse tempo laborado, acrescido do adicional mínimo de 50%.

Só que tal interpretação começou a gerar distorções quando havia a redução irrisória do intervalo intrajornada. Nesse sentido, pouco importava se o empregado não tinha gozado a pausa ou folgado 58 minutos[3][3] Essa situação ocorre com frequência quando os empregados registram o gozo do intervalo intrajornada. Lembrar que o art. 74, §2º da CLT admite a pré-assinalação do período de repouso.
Art. 74 da CLT: (…)
§2º: Para os estabelecimentos de mais de dez trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho, devendo haver pré-assinalação do período de repouso.
(…).
(para jornadas superiores a 06 horas diárias). Em ambos os casos, o resultado era o mesmo: pagamento de 01 hora extra, o que favorecia as empresas que intencionalmente suprimiam o descanso do trabalhador.

Por sua vez, a jurisprudência estava proferindo decisões conflitantes sobre o tema. Logo, distribuído o processo nº 0001384-61.2012.5.04.0512 em 09/12/2015, a 7ª Turma do TST resolveu propor o Incidente de Recurso de Revista Repetitivo (IRR)[4][4] O IRR é técnica de julgamento uma vez constatada a multiplicidade de Recursos de Revista sobre idêntica questão de direito, cuja decisão pode ser transferida à Seção Especializada em Dissídios Individuais ou ao Tribunal Pleno, tendo em vista a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes (art. 896-C da CLT e arts. 280 a 297 do Regimento Interno do TST). Através desse Incidente, são afetados um ou mais recursos representativos da controvérsia para julgamento conjunto, determinando o Presidente do TST a suspensão dos demais recursos idênticos interpostos até o pronunciamento definitivo do Tribunal. O conteúdo do acórdão publicado vinculará as decisões dos Tribunais Regionais sobre igual tema, promovendo assim a uniformização da jurisprudência., cuja solução foi afetada ao Tribunal Pleno, sob a relatoria da Min. Kátia Arruda.

Através desse julgamento, o Tribunal Superior do Trabalho pacificou a matéria para as ações que tratem da supressão parcial do intervalo intrajornada, com a redação do art. 71, §4º da CLT anterior à Lei nº 13.467/2017.

A posição do TST e seus efeitos jurídicos

Para a correta compreensão da decisão, antes, é preciso indicar as premissas adotadas pelo Tribunal Superior do Trabalho:

1ª) TEMA DISCUTIDO[?][?] Despacho de ID nº 1001778D99532F06D5, p. 02

Intervalo Intrajornada – Concessão Parcial – Aplicação analógica do art. 58, §1º da CLT

2ª) QUESTÃO SUBMETIDA A JULGAMENTO[?][?] Despacho de ID nº 1001778D99532F06D5, p. 03

3ª) TESES CONFLITANTES SOBRE A MATÉRIA

Conforme o acórdão[5][5] Na ocasião, foi também afetado o processo nº 0000864-62.2013.5.09.0016 para julgamento conjunto. do Incidente de Recurso de Revista Repetitivo, existiam 03 posições quanto ao pagamento do intervalo intrajornada por causa da subtração de poucos minutos da duração mínima fixada no art. 71 da CLT.

A primeira determinava a aplicação da Súmula nº 437, I do TST, com o pagamento de uma hora integral, acrescido do adicional de horas extras e reflexos, ainda que a supressão tenha sido ínfima. Desse modo, não se admitia a aplicação analógica do art. 58, §1º da CLT[6][6] Art. 58 da CLT: A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.
§1º: Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário no registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários.
(…)
, que cuida do tempo residual anterior e posterior à efetiva prestação de serviços.

Era o entendimento do TRT da 1ª Região[7][7] Cf. Tese Jurídica Prevalecente nº 06 do TRT1. TRT da 3ª Região[8][8] Cf. Súmula nº 27 do TRT3., TRT da 9ª Região[9][9] Cf. Súmula nº 19 do TRT9 e Tese Jurídica Prevalecente nº 04 do mesmo Tribunal. e do TRT da 13ª Região[10][10] Cf. Súmula nº 07 do TRT13., além da posição da 1ª, 2ª, 3ª e 4ª Turmas do Tribunal Superior do Trabalho:

EMENTA: (…) RECURSO DE REVISTA ADESIVO INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. INTERVALO INTRAJORNADA. SUPRESSÃO DE POUCOS MINUTOS. TOLERÂNCIA. 1. Segundo a Súmula nº 437, I, do TST, a não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, implica o pagamento total do período correspondente. Trata-se de medida voltada à higiene, saúde e segurança do trabalhador, que não admite a aplicação analógica do limite de tolerância disposto no art. 58, §1º, da CLT. 2. Prosseguindo no julgamento, com amparo no princípio da causa madura (art. 515, §3º, do CPC/1973), é devido, em razão da inobservância do intervalo intrajornada, o pagamento integral do período correspondente, acrescido de, no mínimo, 50%, com repercussão nas demais parcelas de natureza salarial, conforme preceitua a Súmula nº 437, I e III, do TST. Recurso de Revista conhecido e provido (TST; Processo nº RR-1621-87.2012.5.09.0017; Órgão Julgador: 1ª Turma; Relator: Ministro Walmir Oliveira da Costa; Data de Publicação: DEJT 02.12.2016).

EMENTA: RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.015/2014. 1. INTERVALO INTRAJORNADA. HORAS EXTRAS. TOLERÂNCIA EM RELAÇÃO AOS MINUTOS RESIDUAIS PREVISTOS NO ART. 58, §1º, DA CLT. APLICAÇÃO POR ANALOGIA. IMPOSSIBILIDADE. A inobservância do intervalo intrajornada, ainda que da ordem de poucos minutos, enseja o pagamento do período total correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de cinquenta por cento, nos termos da Súmula 437 do TST. Portanto, ao contrário do entendimento consubstanciado na decisão do Tribunal Regional, não se aplica, ainda que analogicamente, o disposto no art. 58, § 1º, da CLT quanto à tolerância do limite máximo de 10 (dez) minutos nos registros de ponto. Precedentes. Recurso de Revista conhecido e provido (…) (TST; Processo nº RR-20168-69.2014.5.04.0204; Órgão Julgador: 2ª Turma; Relatora: Ministra Delaíde Miranda Arantes; Data de Publicação: DEJT 26.05.2017).

EMENTA: RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. INTERVALO INTRAJORNADA. CONCESSÃO PARCIAL. SUPRESSÃO DE MINUTOS. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 58, §1°, DA CLT. Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração. Incidência da Súmula 437, I/TST. Na hipótese, a Corte de origem consignou que “nos dias em que houve o gozo de intervalo superior a 50 minutos, a reclamante não faz jus ao pagamento de uma hora extra”. Verifica-se, portanto, que a decisão regional, ao entender pela aplicação analógica do art. 58, §1º, da CLT, para fins de apuração do intervalo intrajornada de uma hora, encontra-se dissonante com o entendimento contido na Súmula 437, I/TST. Julgados desta Corte. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST; Processo nº RR-64-98.2014.5.04.0384; Órgão Julgador: 3ª Turma; Relator: Ministro Maurício Godinho Delgado; Data de Publicação: DEJT 12.05.2017).

EMENTA: RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO NOVO CPC. INTERVALO INTRAJORNADA. CONCESSÃO PARCIAL. O entendimento do Regional, de que apenas é devido o pagamento integral do intervalo intrajornada quando o período for inferior a cinquenta minutos, contraria o disposto no art. 71, caput, da CLT que estabelece, explicitamente, o intervalo de, no mínimo, uma hora para qualquer trabalho contínuo cuja duração exceda a seis horas. Impossibilidade de aplicação analógica do art. 58, §1º, da CLT. Precedentes. Recurso de Revista conhecido e provido (TST; Processo nº RR-1420-69.2013.5.04.0512; Órgão Julgador: 4ª Turma; Relatora: Ministra Maria de Assis Calsing; Data de Publicação: DEJT 30.06.2017).

Foi também o que defendeu o Ministério Público do Trabalho na sua manifestação. De acordo com o órgão, não é possível considerar como regular o intervalo intrajornada inferior a 01 hora para jornadas superiores a 06 horas, mesmo que a redução envolva poucos minutos, pois a pausa objetiva preservar a saúde e a higidez física/mental do empregado.

E, por apresentar natureza obrigatória, cogente e irrenunciável, esse intervalo não é passível de qualquer flexibilização, seja pela aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade ou do art. 58, §1º da CLT de forma analógica.

A segunda posição aceitava a aplicação analógica do art. 58, §1º da CLT e da Súmula nº 366 do TST ao intervalo intrajornada. Assim, as variações de até 05 minutos no início e/ou fim da pausa, observado o limite de 10 minutos diários, não eram consideradas. Ultrapassado tal limite, porém, todo o tempo deveria ser computado como hora extra.

Para os defensores dessa corrente, pequenas oscilações (até 10 minutos) no registro do intervalo fazem parte da dinâmica da marcação, caso contrário haveria o típico registro britânico. Logo, não se mostra razoável a condenação ao pagamento de 01 hora extra, porque foi cumprido o fim do art. 71 da CLT que é proporcionar o descanso ao trabalhador.

SÚMULA Nº 366 DO TST: CARTÃO DE PONTO. REGISTRO. HORAS EXTRAS. MINUTOS QUE ANTECEDEM E SUCEDEM A JORNADA DE TRABALHO (nova redação) – Res. 197/2015 – DEJT divulgado em 14, 15 e 18.05.2015. Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário do registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários. Se ultrapassado esse limite, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal, pois configurado tempo à disposição do empregador, não importando as atividades desenvolvidas pelo empregado ao longo do tempo residual (troca de uniforme, lanche, higiene pessoal, etc).

Era o entendimento do TRT da 4ª Região[11][11] Cf. Súmula nº 79 do TRT4. e do TRT da 18ª Região, incluídas a 5ª, 6ª e 8ª Turmas do TST:

EMENTA: (…) 2. RECURSO DE REVISTA. INTERVALO INTRAJORNADA. OSCILAÇÃO DE POUCOS MINUTOS. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ARTIGO 58, §1º, DA CLT. POSSIBILIDADE. I. Cinge-se a controvérsia à possibilidade de aplicação analógica do artigo 58, §1º, da CLT no que se refere à concessão parcial do intervalo intrajornada. II. Sabe-se que, a teor do artigo 74, §2º, da CLT, o intervalo intrajornada pode ser objeto de pré-assinalação por parte do empregador. Nada obsta, todavia, que o registro da pausa para repouso e alimentação do trabalhador retrate fidedignamente a realidade, com o assinalar diário da saída e retorno do descanso. III. Em tais hipóteses, evidentemente ocorrerão oscilações, ainda que mínimas, pois do contrário estar-se-ia diante de típico registro britânico. IV. Nesse contexto, é possível reputar exacerbada a condenação ao pagamento de uma hora extra diária, a teor da Súmula 437, I, do TST, nos casos em que a fração de tempo aquém do previsto seja igual ou inferior a dez minutos, podendo se considerar atingida a finalidade do instituto. V. Assim, a decisão que aplica analogicamente o artigo 58, §1º, da CLT, de modo a não considerar como supressão do intervalo intrajornada as frações iguais ou inferiores a dez minutos, não contraria a Súmula 437, I, do TST ou o artigo 71 da CLT. Precedentes. VI. Recurso de Revista conhecido e não provido (TST; Processo ARR-10166-70.2015.5.12.0046; Órgão Julgador: 5ª Turma; Relator: Ministro Antonio José de Barros Levenhagen; Data de Publicação: DEJT 05.05.2017).

EMENTA: RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. INTERVALO INTRAJORNADA. SUPRESSÃO DE POUCOS MINUTOS. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 58, §1º, DA CLT. As pequenas variações de horário no registro de ponto fazem parte da dinâmica da marcação. Eventuais supressões de alguns poucos minutos do intervalo intrajornada, inferiores a dez minutos diários, consistem em oscilação natural na marcação do ponto, não ensejando o pagamento total do período correspondente, sob pena de se estar a exigir registro de jornada britânica. Assim, a adoção do critério de tolerância previsto no art. 58, §1º, da CLT, para a apuração do intervalo intrajornada, não implica ofensa ao art. 71, §4º, da CLT, tampouco contrariedade à Súmula 437, I, do TST. Recurso de Revista não conhecido. (…) (TST; Processo nº RR-1389-53.2012. 5.09.0671; Órgão Julgador: 6ª Turma; Relator: Ministro Augusto César Leite de Carvalho; Data de Publicação: DEJT 06.04.2018).

EMENTA: RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/14 (…). INTERVALO INTRAJORNADA. FRUIÇÃO PARCIAL. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 58 DA CLT. POSSIBILIDADE. Não se afigura razoável a condenação da empresa ao pagamento de uma hora, como extra, quando ínfima a redução do intervalo para descanso e alimentação, uma vez que a finalidade da norma prevista no artigo 71, caput, da CLT, foi alcançada. Aplicação analógica do artigo 58, §1º, da CLT. Recurso de Revista não conhecido (…) (TST; Processo nº RR-1205-87.2014.5.09.0005; Órgão Julgador: 8ª Turma; Relator: Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro; Data de Publicação: DEJT 10.11.2017).

Por fim, a terceira posição reconhecia o pagamento apenas dos minutos faltantes do intervalo intrajornada, quando eles não fossem superiores a dez. Extrapolado esse limite, o empregado tinha direito à hora integral acrescida do adicional de 50%, nos termos da Súmula nº 437, I do TST. É o que decidiu o TRT da 4ª Região no processo afetado ao Incidente de Recurso de Revista Repetitivo:

ACÓRDÃO por unanimidade, (…) DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA para: a) limitar a condenação em 1 hora extra decorrente do intervalo intrajornada às hipóteses em que a supressão do intervalo de 1 hora foi superior a 10 minutos, sendo que, no caso da supressão ser igual ou inferior a 10 minutos, serão devidos como extraordinários apenas os minutos faltantes para completar uma hora; (…) (TRT da 4ª Região; Processo nº RO-0001384-61.2012.5.04.0512; Órgão Julgador: 6ª Turma; Relator: Convocado Roberto Antônio Carvalho Zonta; Data de Publicação: 15.04.2015).

4ª) DECISÃO DO TRIBUNAL PLENO

Considerando que o caso analisado pelo TST:

  • Envolvia variações na marcação do intervalo intrajornada decorrentes da própria dinâmica laboral e não por imposição patronal ou acordo individual ou coletivo;
  • Não examinou: i) a possibilidade de pagamento apenas do adicional de horas extras em razão do intervalo intrajornada descumprido parcialmente; ii) a natureza jurídica da parcela a ser paga; e iii) a possibilidade de redução ou supressão da pausa por negociação coletiva;
  • Abarcou apenas as situações anteriores à vigência da Lei nº 13.467/2017 – Reforma Trabalhista.

O Tribunal Pleno entendeu (p. 40 e 43):

Isso significa que, para o Tribunal Superior do Trabalho, as oscilações eventuais e inferiores a 05 minutos, na marcação do intervalo intrajornada, não constituem situação irregular a fim de atrair a previsão do art. 71, §4º da CLT (ou seja, pagamento de 01 hora extra para as jornadas superiores a 06 horas).

Ultrapassado o limite de 05 minutos, entretanto, será devida a aplicação do dispositivo celetista e da Súmula nº 437, I do TST. Veja, pois, que o Tribunal afastou uso da analogia quanto ao art. 58, §1º da CLT, adotando uma solução intermediária para os processos afetados no IRR e para as demais ações que tratem da mesma situação.

De acordo com o TST, é inegável a importância do intervalo intrajornada para a recuperação física e mental do trabalhador, o que inclusive influencia a segurança da própria prestação de serviços. Tanto é verdade que o legislador, através da Lei nº 8.923/94, instituiu sanção no art. 71, §4º da CLT pelo descumprimento do descanso.

Nesse sentido, a supressão total ou parcial do intervalo não configura mera infração administrativa sujeita à multa[12][12] A multa pela violação ao art. 71, §4º da CLT varia de R$ 40,25 a R$ 4.025,33, conforme a natureza da infração, sua extensão e a intenção daquele que a praticou. A penalidade é aplicada em dobro na hipótese de reincidência, oposição à fiscalização ou desacato à autoridade. (art. 75 da CLT), como defendem parte da doutrina e alguns aplicadores do direito.

Contudo, a interpretação da norma jurídica deve se pautar pela razoabilidade e proporcionalidade entre a sua infração e sanção respectiva. Paralelamente, é necessário considerar a capacidade que o sujeito tem de evitar, com maior diligência, a violação do comando legal.

Só que no caso analisado, a relatora, Min. Kátia Arruda, atestou que, na falta de pré-assinalação do período de repouso, é (p. 30):

humanamente impossível evitar pequenas variações na marcação do intervalo, gerada pelos mais diversos fatores[13][13] São exemplos: fila de registro de ponto, diferença entre o relógio pessoal e o relógio de ponto, antecipação voluntária do trabalhador para evitar fila, etc. que não podem ser controlados pelo empregador, inclusive o tempo de deslocamento do posto de trabalho até o local de registro de horário, por mais próximo que ele seja. Ainda que cada empregado tivesse um equipamento para registro de ponto em seu posto de trabalho, pequenas variações seriam inevitáveis, porque os seres humanos não são máquinas de precisão.

Assim, não se mostra razoável a condenação ao pagamento de 01 hora integral (com adicional de 50% e reflexos) quando existe a redução eventual e ínfima do tempo de descanso. E continuou a Ministra (p. 31):

a imposição da mesma sanção pela redução do intervalo intrajornada em 5 ou 50 minutos, afronta o princípio da igualdade (art. 5º, caput e II, da CF), pois implica o reconhecimento de efeitos iguais a fatos totalmente distintos, distanciando-se da finalidade da lei que é corrigir a ação do efetivo infrator, penalizando-o com a imposição de ressarcimento do direito violado.

Cumpre ressaltar que o Tribunal, com essa decisão, não visa justificar e estimular a violação do art. 71 da CLT, no que tange à correta fruição do intervalo para repouso e alimentação. O que “se busca é o reconhecimento de que a interpretação que se confere à lei não pode ser dissociada dos fatos da vida que se pretende regular” (p. 31).

Logo, as oscilações mínimas no descanso do empregado não afrontam princípios, leis ou qualquer norma constitucional, afastando, via de consequência, o direito ao ressarcimento pecuniário nessa situação específica. Do contrário, haveria o enriquecimento ilícito do trabalhador.

Em relação à aplicação analógica do art. 58, §1º da CLT, o TST explicou que, na época da edição da Súmula nº 437, foi rechaçada a possibilidade de usar o entendimento da Súmula nº 366 nos casos de pequenas variações do intervalo intrajornada, porque os textos sumulados abarcam hipóteses[14][14] Enquanto o art. 58, §1º da CLT se refere apenas ao início e término da jornada, cuidando da parte econômica sobre a percepção ou não de horas extras, o art. 71 da CLT dispõe sobre matéria de saúde e segurança a respeito do descanso obrigatório intrajornada. distintas.

Como se não bastasse, prevaleceu o argumento do Ministério Público do Trabalho no sentido de ser inadequada e desproporcional a utilização do art. 58, §1º da CLT (p. 35-36):

Porém, o douto Ministério Público do Trabalho, em seu parecer, formula argumento que não pode ser desconsiderado, qual seja, de que a aplicação desse dispositivo em relação ao intervalo intrajornada não é proporcional. Como bem lembrado pelo Parquet, numa jornada de oito horas, cinco a dez minutos correspondem de 1/96 (um noventa e seis avos) a 1/48 (um quarenta e oito avos) ou, aproximadamente, 1% a 2% da jornada. Já no intervalo intrajornada de uma hora, esses cinco a dez minutos equivalem de 1/12 (um doze avos) a 1/6 (um sexto) ou, aproximadamente, de 8% a 16% do tempo de descanso.

Evidentemente, o que se busca não é uma perfeita proporção matemática, mas um parâmetro cuja observância seja viável no mundo dos fatos, e do qual emane uma ideia de equilíbrio e justiça, que possa ser assimilada e praticada pelos atores sociais, alcançando a efetiva pacificação social.

É nesse contexto que, embora não aplicando diretamente o art. 58, §1º, da CLT, o utilizamos como parâmetro para declarar ínfima a redução total de até cinco minutos do intervalo intrajornada (ou seja: somados aqueles do início e término do intervalo), decorrentes de variações do registro de ponto.

O impacto atual da decisão do TST

Embora o julgamento do Tribunal Superior do Trabalho, em sede de IRR, atinja apenas as situações anteriores à Reforma Trabalhista, é possível defender o uso dos argumentos levantados no acórdão para os casos a partir de 11/11/2017[15][15] Data de entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017..

Se as pequenas variações no registro do intervalo intrajornada são inevitáveis, visto os inúmeros fatores cotidianos que fogem ao controle do empregador, não existe razão para afastar a tolerância dos 05 minutos também sob a égide da Lei nº 13.467/2017. As mesmas dificuldades apontadas pela relatora, Min. Kátia Arruda, são verificadas no presente momento.

Uma vez considerada regular a redução de até 05 minutos no descanso do obreiro, a empresa não poderá sofrer qualquer sanção, seja no tocante à multa administrativa ou ao pagamento do período suprimido com o acréscimo de 50%. Aqui, não há que se falar em reflexos, porque o valor do intervalo intrajornada descumprido não possui mais natureza salarial:

Art. 71 da CLT: Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas.
§1º: Não excedendo de 6 (seis) horas o trabalho, será, entretanto, obrigatório um intervalo de 15 (quinze) minutos quando a duração ultrapassar 4 (quatro) horas.
(…)
§4º: A não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento, de natureza indenizatória, apenas do período suprimido, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.
(…)

Assim, por exemplo, ocorrida a redução eventual de 02 minutos no intervalo do empregado (ou seja, gozo de 58 minutos de descanso), tal circunstância não acarretará nenhuma consequência. Se, porém, o repouso intrajornada for de 50 minutos, aí serão devidos os 10 minutos com o acréscimo de 50%, na forma da atual redação do art. 71, §4º da CLT, sem prejuízo da aplicação de multa pela fiscalização do trabalho.

O mesmo raciocínio se aplica para o excesso de até 05 minutos na fruição do descanso (ou seja, 01 hora e 05 minutos). Esse tempo a mais não poderá ser descontado do empregado ou exigida pela empresa a sua compensação no final da jornada diária.

De todo modo, caso o empregador não efetue a pré-assinalação do intervalo intrajornada (art. 74, §2º da CLT), é sempre recomendável observar a pausa mínima de 01 hora ou 15 minutos, a depender da jornada pactuada com o trabalhador.

Obras consultadas

  • DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 17. ed. obra revista, atualizada e ampliada conforme Lei n. 13.467/17 e MPr. n. 808/17. São Paulo: LTr, 2018, p. 1.036-1.037 e 1.123-1.130.
  • MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 35. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 808-810 e 856-862.
  • PINTO, Raymundo Antônio Carneiro. Súmulas do TST Comentadas. 13. ed. São Paulo: LTr, 2012, p. 318-319 e 376-378.
  • VIANNA, Cláudia Salles Vilela. Manual Prático das Relações Trabalhistas. 12. ed. São Paulo: LTr, 2014, p. 297, 306-307 e 320-323.